domingo, junho 13, 2010

3.


O sol entrava de mansinho por entre as frestas da persiana, desenhando pequenos e sequenciados buracos de luz na parede oposta. Rómulo dormia invariavelmente de barriga para cima, ressonando alarvemente, quando o despertador se decidia a tocar. Acordava sempre com as notícias, o rol de desgraças anunciado em cinco minutos

_____por cá o desemprego aumentou em relação ao período homólogo do ano passado e o índice de pobreza atingiu valores máximos, já no

__________escolher país

_____a escalada de violência continua, mais

__________escolher número

_____mortos desde a última contagem, enquanto no

__________escolher outro País

_____um

__________escolher catástrofe natural

_____vitimou

__________escolher outro número, desta vez à volta dos milhares

_____mas não há

__________descansem, portanto

_____portugueses entre a vítimas, e por agora é tudo, esperamos que tenha um bom dia na companhia da sua estação preferida, já de seguida ouça a melhor música

tão absurdamente deprimente, rapidamente o afastava de qualquer sono ou sonho prazenteiro que estivesse a ter. Era então altura de se arranjar e seguir para a escola, onde em pouco menos de uma hora logo teria de aturar uma horda de adolescentes em guerra permanente com as suas hormonas

_____e portanto com todo o mundo

e com pouca vontade de absorverem o fascínio da matemática. Era o facto de acordar com as notícias e de ler o jornal com o café no bar da escola que o impedia de pensar

_____mas que raio fiz eu para merecer isto

pois apesar de ter quase cinquenta anos e estar divorciado, de ocupar sozinho uma cama de casal, de ter de lidar com seres humanos em crescimento e em constante ebulição, de guardar já poucas amizades e contactos familiares, de se sentir incrivelmente só à hora de jantar, pelo menos não estava desempregado, não estava num país em guerra, não assistira a nenhuma catástrofe natural e o futuro, quem sabe, ainda poderia trazer algo de melhor a tão insípida vida.

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